segunda-feira, 16 de março de 2015

Poema de toalha de papel



no instante da viagem
rasgas o véu
qual dardo de terra e lama
sulcas o horizonte de inverno
de seios abertos
não há recordação que não esqueças
apesar do zinabre que te pesa nos ombros
fazendo-te sentir mais memória
que momento presente

sexta-feira, 6 de março de 2015

Fingimento

É difícil encontrar quem nos ame,
Ah! Ninguém nos entende.
Oiço por aí que, como nós,
Quem muito escreve,
Só escreve porque mente.
E eu, 
Eu percebo verdadeiramente!
Pois como vocês, caros amigos,
Finjo que vivo o que não vivo.
Toda a dor, todo o amor,
É todo um mundo,
Aflitivo,
Que só existe no papel.
Mas quem, como nós, mente,
Também sofre, também ama, também sente.
E como é bela esta vida sonhada...
Mentimos quase tão perfeitamente que,
Na vida,
Aquilo que tanto escrevemos e mentimos,
Chega a ser verdade para tanta gente!

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Fão

- Vês aquela luz ali ao fundo?

Já tinha saudade destas tardes de Verão em Fão. Acho que a ultima vez que cá estive, ainda nem sequer estávamos no novo milénio. O Y2K ainda era levado a sério e os sonhos pareciam reais.
Na altura de câmara em riste, fantasiava ser artista, um fotografo de renome, armado com rolos kodak, e por vezes fuji quando o dinheiro não chegava. A preto e branco, a disparar a tudo que não se mexia. Sempre encontrei mais conforto e interesse no que não é humano.

Hoje, depois das incontáveis sms com pedidos pelas míticas clarinhas de fão da confeitaria de beira de estrada, aquela mesmo antes da ponte, sinto que parte de mim ficou aqui, capturada num negativo de outrora, num negativo de agora, em que me revelo.

- Vês agora? Ali, estás a ver?

- Sim...



sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Acerca-se a hora da imunação, que estas palavras vão para cadáveres...

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Saio fechando a porta atrás de mim

Saio fechando a porta atrás de mim. Chamo o elevador, o único acesso à garagem. Um mal necessário. Na pressa reparo que me esqueci do amuleto. Não é nenhuma pata de coelho, apenas um gasto berlinde sem brilho, dos tempos de criança. Talvez tenha sido melhor não o ter trazido, pensando bem, nunca me deu assim tanta sorte.

Saio do elevador para uma sombria garagem, devem todos ter saído, apenas vejo o carro do vizinho do ultimo andar e o meu. Tenho o mesmo carro desde que comecei a conduzir. Não está tão velho quanto isso, tirei a carta de condução mais tarde que o normal, e além disso conservo-o muito bem. Para o emprego vou de metro, por isso só o uso ao fim-de-semana.

Sento-me atrás do volante, rodo as chaves e tenho que esperar. O motor tem de aquecer e eu ainda à espera...

Disseram-me ao telefone que chegava dentro de uma hora um avião de Paris. Será que vens nele? Será que virás ao menos hoje?

Tiro do bolso da camisa, a impressão do teu email:

"Assunto: Olá!
Data: 2015-02-06
Remetente: serendipity@yourmail.com

Chego dia 10! :)

Podes-me ir buscar ao aeroporto?

Era bom ver-te de novo.

Jokinhas!"

Tiro um cigarro do maço, carrego no botão do isqueiro do carro e continuo a aguardar que tudo aqueça...





sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

#Desejo

Por seres um incógnito cativo na tua viagem,
não te apercebes que o captor és tu.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Inspiração

Nas noites em que a espero e me sento,
De copo na mão, serena e calma.
Nessas noites, não há nada,
Ela nunca chega.
E com a folha já amarrotada,
Sem nenhum alento,
Embebedo o corpo e a alma.
Porque ela é assim, uma vontade indomada.
Que sem convite, sem ser esperada,
Vem gritar-me ao ouvido ainda com mais gana.
Nas noites em que quero dormir e esquecer,
Não me larga, não me dá descanso.
E pela madrugada, o cansaço é já tanto,
Que a deixo livre nas mãos,
Fecho os olhos descansada,
Para o que ela quiser escrever.